loucura, eugenia e guerra contra os corpos-territórios
📌 painel de refs [de Minas Gerais ao Oriente Médio]
Como estou correndo com várias tarefas esse mês e ainda sendo lar temporário de alguns filhotes de cachorros resgatados (vejam as fofuras aqui e colaborem na rifa solidária com 3 prêmios, incluindo vale compras na Ginna, e me ajudem na divulgação!), as coisas estão complicadas por aqui e não tenho conseguido escrever o tanto quanto gostaria.
Para que vocês tenham conteúdo de sobra enquanto preparo o EP4 do Feminismo é luta de classes! (já ouviu o EP3?), o texto sobre não-procriação como luta de classes e trabalho na edição dos próximos livros da editora Ginna (viu que já está em pré-venda nosso próximo lançamento aqui?), fiz uma seleção de boas referências para ler, ver e, quem quiser ouvir alguma coisa diferente, eu indico o Alexsucks (com faixa novíssima divulgada no último dia 30). Bora!
Holocausto Brasileiro (2016)
Recentemente, para apoiar a Luana com os resgates dos cachorros (a @art.lua, que fez a arte que estamos usando agora no Feminismo é luta de classes!) precisei fazer um bate e volta até Barbacena (MG). Aproveitei para conhecer o Museu da Loucura, localizado no antigo Hospital Colônia de Barbacena, onde 60 mil pessoas morreram pelos maus tratos do Estado e da nascente indústria psiquiátrica.









O hospital foi construído na sequência da criação da Assistência aos Alienados no estado em 1900 em 8 mil metros quadrados, juntamente com um cemitério, o que já dava pistas sobre o caráter de depósito que o “hospital” viria a ter. Vagões repletos de “loucos”, com mulheres e homens majoritariamente pretos, pardos e pobres chegavam à Barbacena semanalmente. Depois, chegariam as crianças. Dizem que uma grande parte das pessoas no Hospital Colônia não tinham problemas mentais e eram os considerados “indesejados sociais”, como mulheres que engravidavam fora do casamento, alcoólatras, homossexuais, prostitutas e andarilhos. O Colônia era uma das sete instituições psiquiátricas da região, o que levou Barbacena a ficar conhecida como a “cidade dos loucos”.
As próprias famílias deixavam seus familiares no Colônia e desapareciam. Cadáveres era o que não faltava na instituição, que construiu um esquema de vendas de corpos para universidades. Mas os experimentos não aconteciam apenas depois de mortos, pelo contrário, a psiquiatria sempre foi - e continua sendo - um grande experimento coletivo de baixo risco e altos ganhos para a indústria. Dos homossexuais, prostitutas e malucos para crianças e adolescentes que nasceram no corpo errado, não há limites para o que a psiquiatria é capaz de fazer em nome do controle social e do lucro.
Inclusive, essa crítica faz falta no documentário Holocausto Brasileiro (2016) da jornalista Daniela Arbex, onde ela ouve sobreviventes e ex-funcionários para narrar a história de uma tragédia pouco conhecida no Brasil. O documentário, que está disponível na Netflix, é excelente, mas ao olhar para o Estado (sem dúvidas, o maior responsável pelas mortes e pelo tratamento desumano do Colônia), familiares e ex-funcionários, Daniela esqueceu de olhar para a Ciência que validava muitas das práticas sendo desenvolvidas e empregadas ali: a psiquiatria. Faltou lembrar que a psiquiatria é, e sempre foi, uma prática experimental que não pode ser verificada por meio da materialidade objetiva. Até que ponto o ser humano é capaz de tratar o outro como rato de laboratório é seu único limite.
O livro da jornalista também inspirou o longa metragem Ninguém sai vivo daqui (2023) e centra na história de Elisa, internada à força pelo pai no Hospital Colônia, por ter engravidado do namorado. Em nome da psiquiatria, essa é uma história para ser lembrada e relembrada.









série de palestras sobre sexo e gênero
A Profa. Dra. Terezinha Martins está organizando uma série de palestras pelo canal do YouTube do Negrem Unirio sobre sexo, gênero e identidade. Já passaram por lá Daniela Vaz para falar sobre saúde e mulheres; a própria Terezinha falando sobre o crescente ataque aos direitos das mulheres e a Isabela Callegari, que tem uma pesquisa independente que mapeia o apagamento da categoria sexo e a renovação do patriarcado. Eu vi parte dessa palestra dela pessoalmente e, se você não viu, indico, pois vale o tempo.
Lembrando que, se vocês quiserem saber mais sobre o tema, o aulão “Sexo e Gênero: uma compreensão ecofeminista” está disponível lá no meu site. Chega mais.
entendendo a guerra ilimitada
O único caminho adiante para os patriarcados na crise epocal do capitalismo é a guerra. Enquanto ela se dissemina e as forças patriarcais ocidentais e orientais adentram em um há muito esperado conflito bélico, nós devemos lembrar que não há Estado bom e que, como estamos vendo ser noticiado, são as pessoas que perdem com a guerra entre os Grandes Homens - elas perdem suas condições de vida, parentes, filhos, amigos, suas próprias vidas. Às mulheres, resta organizar o caos e dar um jeito de fazer a vida continuar.
Para refletir criticamente sobre esse momento no Oriente Médio, indico o artigo The Paradigmatic Roots of Öcalan’s Call for “Peace and Democratic Society”, publicado em inglês no site da Academy of Democratic Modernity (a parte 2 está aqui). Em breve, quero trazer ambos os artigos traduzidos aqui para vocês, mas em suma, a análise parte da carta de Abdullah Öcalan, divulgada em fevereiro, na qual o líder curdo fez algo que ninguém esperava: da sua cela na ilha de Imrali, propôs a dissolução do PKK - um dos últimos partidos socialistas sobreviventes da guerra fria - e o abandono das armas.
Para o Movimento de Libertação Curdo, não é rendição, mas estratégia madura de quem entende que estamos na terceira guerra mundial e que a modernidade capitalista está falindo no Oriente Médio. Enquanto Israel emerge como potência hegemônica regional, a Turquia treme na base e Rojava já provou que o Confederalismo Democrático funciona, Öcalan oferece uma saída civilizatória para o impasse, e ela não passa pela celebração da guerra.
Até a próxima,
Marina Colerato