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Feminismo é luta de classes!
EP3 Feminismo é luta de classes!
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EP3 Feminismo é luta de classes!

A crise epocal do capitalismo
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Neste terceiro episódio do Feminismo é luta de classes!, mergulhamos em uma análise histórica profunda para compreender a crise climática atual como expressão de uma crise muito maior: uma crise epocal do capitalismo. Argumento que vivemos o esgotamento de um sistema que, por mais de 500 anos, organizou a vida na Terra sob a lógica da acumulação infinita.

O capítulo começa com um convite a repensar a forma como narramos a história. Ao contrário da ideia de um Antropoceno — em que a humanidade como um todo seria igualmente responsável pela crise climática —, fico com o conceito de Capitaloceno. Essa perspectiva, desenvolvida por Jason Moore e ecoada por outras vozes críticas, nos permite entender a crise atual não como obra de uma “humanidade abstrata”, mas como resultado histórico do patriarcado capitalista.

A análise do Capitaloceno nos mostra que a verdadeira virada histórica não se deu com o vapor ou o carvão, mas com a invasão das Américas em 1492, que marcou o início de uma nova forma de organizar a natureza e o trabalho. Foi nesse momento que surgiram as bases da ecologia-mundo capitalista: uma rede global de poder, produção e reprodução que passou a transformar tanto a natureza humana quanto a extra-humana em insumos baratos para o capital. A floresta virou matéria-prima, as mulheres foram domesticadas e viraram força de trabalho invisibilizada para servir à classe proletária nascente e os povos colonizados foram reduzidos à “Natureza”.

Três processos históricos interligados são cruciais aqui:

  1. a acumulação primitiva (com a expropriação violenta de terras e corpos),

  2. a generalização da propriedade privada,

  3. a revolução científica, que racionalizou a natureza como uma máquina.

Juntos, esses processos criaram uma “Natureza Barata”, fundamento da lei do valor capitalista. A produção passou a depender da exploração do trabalho assalariado e, ainda mais, da apropriação do trabalho não remunerado de mulheres, povos colonizados e da biosfera. Surgem então a “unidade diferenciada de classe: o Proletariado, o Femitariado e o Biotariado.

Essa lógica levou à criação constante de fronteiras — geográficas, ecológicas e simbólicas — onde o capital buscava novas zonas de apropriação. No entanto, chegamos a um ponto de inflexão. As fronteiras estão se esgotando. As “Naturezas Baratas” — o trabalho, a comida, a energia e as matérias-primas — estão se esgotando. O que Moore chama de “Grande Implosão” representa o colapso dessa estratégia histórica de expansão e apropriação.

O capítulo demonstra ainda como a financeirização e a “economia verde” funcionam como tentativas desesperadas de produzir novos fixes — soluções temporárias para sustentar a acumulação. Mas a resposta da biosfera — visível no colapso climático, na escassez de recursos e na intensificação das desigualdades — indica que esses fixes já não são suficientes.

Encerramos com a ideia de que não se trata apenas de um fim do capitalismo como o conhecemos, mas da possibilidade de uma reviravolta histórica. A crise epocal cria campo para uma nova luta de classes. Essa luta deve ser, acima de tudo, uma luta pela liberação da vida em todas as suas formas.

No próximo capítulo, aprofundaremos a perspectiva ecofeminista para entender como o patriarcado foi fundamental na formação dessa ecologia-mundo capitalista — e por que sua superação é condição essencial para a justiça ecológica e a construção de futuros viáveis. Não esquece de seguir o programa lá no Spotify.

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Recursos para melhor compreensão do episódio:


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Neste episódio do podcast, abordo a agenda do “desenvolvimento sustentável”, atualmente também midiatizada como economia verde, que promete, desde os primeiros acordos neoliberais para o desenvolvimento, promover crescimento econômico de forma justa e verde. Para as mulheres, isso significou a inserção na economia de mercado e o aprofundamento das vulne…

Pontos centrais abordados no episódio anterior:

  • Crise climática como oportunidade de negócio: A emergência climática é apropriada pelo neoliberalismo como nova fronteira de acumulação.

  • Fracasso dos acordos internacionais: Apesar de décadas de conferências climáticas, as emissões globais continuam subindo — revelando a ineficácia das soluções de mercado.

  • Ascensão da “economia verde” pós-2008: Sob o discurso de sustentabilidade, surge uma lógica de precificação e financeirização da natureza — transformando florestas, oceanos e clima em ativos negociáveis.

  • Matemática climática neoliberal: A crise é gerida por uma lógica de cálculo e lucro, onde a “salvação” do planeta é condicionada à sua rentabilidade.

  • Natureza como ativo financeiro: Mercados de carbono, compensações e serviços ecossistêmicos são instrumentos de uma nova fase do capitalismo verde.

  • Domínio das grandes instituições globais:

    Organismos como a ONU promovem a narrativa do “crescimento verde” via parcerias público-privadas, enquanto marginalizam debates sobre justiça climática.

  • “Estamos todos no mesmo barco” — será?:

    O discurso da universalização da responsabilidade ignora desigualdades históricas, estruturais e territoriais.

  • Enquadramento pós-político:

    A crise climática é transformada em um problema técnico, despolitizado, que paralisa a ação coletiva e transfere responsabilidade para indivíduos.


Sobre o podcast:

O podcast Feminismo é luta de classes! é uma formação política feminista que objetiva contar a história das mulheres e abordar o feminismo sob uma perspectiva classista, de maneira a promover a consciência sobre a existência e condições materiais da classe sexual feminina para além do sistema capitalista e de forma interconectada com a crise climática e ambiental na qual vivemos.

Ao longo dos 10 episódios, eu explico as origens da nossa crise multidimensional e onde diversos indicadores como violência física, feminicídio e estupro, saúde mental, nível de avanço em direitos legais, equidade econômica, entre outros revelam uma piora nas condições de vida de mulheres e meninas em todo o mundo. Apenas uma perspectiva materialista histórica nos dá as ferramentas necessárias para compreensão e transformação desse cenário. Nas palavras da ecofeminista Ariel Salleh, "qualquer denominador comum entre a classe trabalhadora, mulheres, indígenas e política ecológica precisa ser uma política materialista".

As referências e o conteúdo completo estão na minha dissertação de mestrado, Crise climática e antropoceno: ema perspectiva ecofeminista para liberar a vida(2023), realizada na PUC-SP com bolsa da CAPES.


O podcast Feminismo é luta de classe! foi viabilizado por meio de um financiamento coletivo com apoio de uma 164 pessoas! Agradeço especialmente a cada uma e cada um que colaborou com R$ 35 ou mais:

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Arte por: Luana Fernandes \ @artlua_studio

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